AMOR EM 3 UA


Início – Consideramos justa...


I've got myself just a little bit of love that I wanna spend on you

But baby, I'll never get that chance to dance that romance with you

Oh, no, 'cause you're always hittin'

And kickin'

And putting me down

A velha dona da banca de legumes quase sentia falta da época em que a Vila da Folha era assolada por guerras, quando pouquíssimos ninjas ficavam para trás para defender os cidadãos. Eram tempos difíceis, de preocupação constante, desesperança pelo dia de amanhã, solidão, mas como a maioria das batalhas aconteciam nas fronteiras, também eram tempos silenciosos.

- Haaa~ – Ela suspirou, encurvada sobre a vassoura que usava para varrer as poucas folhas da frente da sua loja. – O povo resolveu ter muitos filhos ao mesmo tempo...

O barulho vindo da frente da loja ao lado da sua, um pequenino café, era quase ensurdecedor devido o tom agudo das vozes. Uma dúzia de moças e rapazes se enrodilhavam a volta de um galante Uchiha Sasuke, o sorriso faceiro sempre presente no rosto bonito, o flerte fácil que parecia escorrer de seus lábios como néctar para atrair abelhas, cada gesto e olhar calculado para parecer o mais natural possível, tudo parte da personagem.

Havia muitos jovens, sim, especialmente rondando a rua principal do centro comercial.

Jovens que poderiam aprender a ter um pouquinho mais de amor próprio e entender que por mais que o caçula da família principal dos Uchiha fosse um tremendo namorador, esbanjando sorrisos, elogios, piscadelas e botões de rosa, aqueles e aquelas a quem Sasuke dispensava essas atenções não passavam de distrações momentâneas.

Se até mesmo uma septuagenária com inícios de cataratas no olho esquerdo conseguia enxergar a verdade sobre o rapaz, aqueles e aquelas jovens também deveriam.

A cena que delatava o verdadeiro interesse do jovem Uchiha já vinha acontecendo há quase dois anos sempre que uma certa kunoichi se encontrava trabalhando pela vila, e não viajando em missões, naquele mesmo momento após o pôr-do-sol, naquele mesmo lugar, porque tanto a velha quanto Sasuke sabiam ser aquela a rota que ela fora designada para patrulhar.

A velha apoiou as duas mãos no topo da vassoura na altura do peito e aguardou alguns segundos.

Com a pontualidade de um relógio, Hyuuga Hinata virou a esquina entre o restaurante de udon e a loja de conveniência. Trazia em si o batom vermelho, o cenho franzido como se estivesse brava com o mundo, as mãos nos bolsos do casaco aberto e o queixo erguido com confiança.

Com a precisão de uma bússola, a atenção de Uchiha Sasuke se voltou naquela direção, seu sorriso fácil se transformou em contentamento genuíno com a serotonina produzida pela visão da moça.

Em um momento o Uchiha estava no meio da roda de fãs – se é que podiam ser chamados assim – e no momento seguinte restara apenas uma nuvem de fumacinha branca que se dissipou antes que a aglomeração que o moreno foi ressurgir em frente a Hyuuga com um animado:

- Yo, Hinata-chan!

- Tch. – A velha riu consigo mesma do olhar de desprezo de Hinata-chan. A frequência com que era usado, especialmente quando dirigido ao jovem Uchiha, fizera com que a moça o elevasse ao nível de uma obra-prima. – Você de novo, Bakasuke.

O sorriso bastante genuíno de Sasuke se alargou, obviamente entendendo o insulto como um chamado carinhoso.

Por mais divertida que fosse a interação, a velha ainda achava estranha aquela forma de paquera. Os jovens ainda usavam essa palavra, paquera?

- Moo, Sasuke-kun~ – A velha desencostou-se da vassoura, sua atenção capturada pelo grupinho de jovens em frente ao café que ficara plantado enquanto seu objeto de interesse se interessava por alguém mais interessante.

- Vamos, Minori, não dá pra competir quando a princesa aparece. – Um dos rapazes escoltou gentilmente uma das meninas para longe, dando a deixa para vários dos outros também se dispersarem. Restaram duas meninas e um rapaz de braços cruzados e olhares, assim como suas posturas, nada amigáveis para a cena de Sasuke tentando jogar seu charme para cima de Hinata, a taxa de sucesso do moreno até agora era abaixo de zero.

- Ugh, sempre isso!

- Quem essa Hyuuga pensa que é?

- Sasuke-kun corre até ela toda vez que a vê apenas para ser tratado pior do que um inseto nojento.

Parecia que o mosquito do ciúme e da inveja tinha picado aqueles três algumas vezes.

O aparente fascínio de Sasuke pela herdeira dos Hyuuga não era muito antigo, mas também não era exatamente recente, já ocorrendo intermitentemente há uns dois anos, se a memória da velha não falhava. No início era triste que aquelas crianças, tão obviamente rejeitadas, ficassem chateadas com a bastante pública e óbvia demonstração de preferência do rapaz, que até então tinha como regra geral dar chance a todes, mas que mesmo assim continuavam cercando-o e aceitando os flertes e promessas que já não levariam a nada. Agora, passado tempo suficiente para perceberem de quem Sasuke realmente gostava, era apenas patético.

- Se vocês já sabem que ele não quer nada com vocês... – A velha levantou a voz para que os três ouvissem claramente suas palavras. - ...vão embora e sigam suas vidas.

- O que disse, velha? – Perguntou uma das moças, indignada com o que tinha ouvido. Quem aquela velha carcomida achava que era para lhe dar um sermão desfavorável sobre sua vida amorosa?

- Sumam daqui! – A velha levantou sua vassoura e apontou para eles. – Já estou cansada de ouvir suas reclamações sem sentido!

- Sua bruxa! Ai! Isso espeta! Ai! Para!

- Xô! Vão embora já! Sumam!

A velha conseguira alcança-los e usava as cerdas duras da vassoura para cutucar-lhes as canelas e as panturrilhas. Os três partiram antes que as cutucadas se tornassem vassouradas em suas cabeças e a velha pode voltar a observar sua atração principal. Tinha perdido a cantada barata que Sasuke usara naquele dia graças àquelas crianças tolas e barulhentas. Ela gostava de memoriza-las e contar a seu marido quando chegava em casa. Se o fazia rir, era uma cantada especialmente ruim.

Naquele momento Hinata tinha uma das mãos levantadas, como se fosse socar Sasuke – como não era incomum de fazer quando ele a irritava o suficiente –, mas sua postura estava paralisada. O moreno, que fechara os olhos e trincara os dentes esperando pelo golpe – um golpe que, ambos sabiam, ele podia desviar com facilidade, mas nunca o fazia, e por isso a moça nunca o acertava com toda a força –, abriu-os para entender o que acontecera.

Sasuke registrou primeiro a emoções que pintaram a expressão da Hyuuga nos dez segundo que demorou para olhar na mesma direção que ela: surpresa, dor, raiva, frustração. Quando olhou para trás de si nada de extraordinário estava acontecendo na rua principal do mercado. Pessoas e lojistas conversavam, famílias faziam suas compras, alguns estudantes tentavam a sorte nas máquinas de gashapon, casais andavam de mãos dadas... Oh. Sasuke avistou-os devido a cabeleira vívida de Menma, o amarelo destacado pelas luzes da vitrine da loja de doces onde pararam, ele e Sakura. Ele com uma das mãos nos bolsos e uma sacola na outra, ela com o braço esquerdo entrelaçado ao dele enquanto apontava para alguma coisa.

Hinata não sabia.

Menma e Sakura tinham finalmente estabelecido um relacionamento aos olhos da vila, mas Hinata não sabia, porque ela passara mais de um mês fora. E era assim que ela tinha que descobrir.

- Hinata...

Sasuke se virou de novo para ela, chamando seu nome enquanto movia seu corpo para ficar entre ela e a imagem do casal, levantando as mãos caso precisasse segurá-la. Conhecendo-a, não era difícil prever que voaria no pescoço de Sakura para ameaçar mata-la se tocasse em Menma, seu homem, como fizera centenas de vezes antes. Sakura, geralmente calma e amável devido seu status de filha do herói da vila, tendo uma reputação a zelar, não se deixava intimidar, respondendo as ameaças de Hinata com condescendência, uma mão abanando o ar e dizendo "claro, claro, desculpe". Menma ficaria ao lado, sorrindo amarelo, o temperamento apaziguador e diplomático de Minato dominando os traços recessivos de impulsividade de Kushina em sua personalidade.

A Hyuuga não fez nada do que Sasuke acreditava que ela faria.

Pelos dezoito anos que se conheciam devido as proximidades dos Clãs Uchiha e Hyuuga – Fugaku e Hiashi eram parceiros de bebida frequentes e "reuniões interclãs" era código para "mais saquê" –, nunca vira Hinata chorar. Derramar lágrimas, sim, porque era uma reação involuntária do corpo à dor e à raiva, mas chorar porque estava triste ou desesperada ou incapaz de conter as emoções, isso nunca.

E, afinal, ali estava.

Sasuke se deu conta, horrorizado, que tinha ficado no melhor lugar da casa para assistir ao coração de Hinata se partir.

Ela não tinha derramado aos lágrimas ainda, empoçadas em seus cílios inferiores.

Sasuke queria tocá-las.

Beijá-las.

Bebê-las.

Queria poder absorver e transferir aquela dor, gota a gota.

Hinata agiu antes, baixou a cabeça de forma que a franja lhe cobrisse os olhos e esfregou-os com força com as mangas da jaqueta. Ao levantar a cabeça de novo, os olhos vermelhos dentro e em volta, a conhecida expressão de irritação voltara ao lugar.

- Acabou a brincadeira, Bakasuke.

- Hinata! – Chamou quando ela se virou para partir. Ela parou quando ele agarrou seu pulso por cima da manga, seus dedos se fechando sobre o tecido úmido. – Você vai desistir?

Ela podia. Ninguém a culparia.

Ela devia. Talvez a olhassem com pena, mas entenderiam.

- Tch. – Ela clicou a língua. – Claro que não. – Sasuke sentiu que ela tremia antes de Hinata puxar o braço para se livrar do aperto dele. Seus punhos estavam cerrados, esbranquiçados nas juntas com a força que fazia para se manter no controle de si mesma. – Mas hoje... Hoje eu p-perdi.

- Sasuke, você estava aqui? – A voz de Menma atrás de si o assustou e o fez se virar de novo, a fração de segundo que a herdeira dos Hyuuga precisava para pular para a marquise mais próxima e fugir.

- Uhn, quem era? – Perguntou Sakura.

A velha suspirou ouvindo o jovem Sasuke mentir sobre quem era a pessoa que tinha acabado de ir embora e desviar o assunto perguntado a Menma e Sakura o que estavam fazendo ali, quando tinham chegado, se queriam jantar, disfarçando, distraindo.

No fim, a Hyuuga e o Uchiha não eram tão diferentes daquelas outras crianças que enxotara mais cedo, correndo em círculos pelos seus interesses amorosos, alimentando-se com migalhas de afeto, regando a plantinha da esperança com o não dito. Uma desilusão amorosa era o remédio mais eficaz para uma paixão platônica ou amor não correspondido em que uma das pessoas insistia em manter-se agarrada aos 'mas e se's.

Bateu com a vassoura no chão para desprender o pouco de poeira que restara antes de voltar para dentro de sua loja bem quando as luzes dos postes se acenderam, os comércios começando a brilhar com seus letreiros de neon. Seu marido teria que se contentar com a história triste que tinha recolhido ao invés de outra cantada ruim.


I hope you don't mean what you say

But I keep seeing you stickin' around

Like you can't get enough

So I stay and I wonder

How my hand would feel intertwined with yours?

Chegara tarde demais.

Agira tarde demais.

…8, 16, 32, sessenta e…Quatro? Eram sessenta e quatro trigramas? Quantas vezes já repetira aquela sequência?

Hinata parou entre um movimento e outro da técnica dos Punhos Gentis. Já não se lembrava a quantidade de trigramas e palmas que estava praticando. Colocou-se ereta, os músculos das costas rangendo, o rosto para as estrelas, a respiração saindo em bufadas cansadas, suor grudando a franja na testa e o resto do cabelo nos ombros e na cintura onde o top não cobria – talvez fosse melhor corta-lo agora que ficara óbvio que Menma preferia garotas com cabelo curto –, batom desgastado de tanto morder os lábios e limpar o suor do lábio superior com as mãos.

Sentia-se uma bagunça tanto quanto parecia uma.

A vila inteira sabia de seus sentimentos por Menma, porque nunca sequer passara por sua cabeça ocultá-los. Eram verdadeiros, honestos, puros, então porque deviam ficar escondidos? E Sakura sabia – rosnara ameaças vezes o suficiente para ter certeza que ela sabia –, o próprio Menma sabia. E ele nunca a rejeitara. Nunca a aceitara, também. Ele seguira vivendo confortavelmente no limbo entre o conhecimento do fato e nunca ter sido diretamente pressionado por uma resposta.

Mas ele sabia, por isso não deveriam ao menos ter tido uma conversa apropriada antes de...

Não, chega.

Hinata cerrou os punhos e trincou os dentes para tentar impedir as lágrimas que ameaçavam se formar outra vez. Já fazia mais de uma semana desde que os vira juntos no centro comercial, era mais do que tempo suficiente para parar de sentir pena de si mesma. Seus sentimentos não eram errados, ainda não tinha desistido.

Respirou fundo, controlou seu chakra, que ainda corria rápido e quente de seu treino caótico, e levantou a mão para agarrar o projétil que tinha sido jogado em sua direção. O nikuman bateu com suavidade em sua palma, ainda estava quente.

- Como esperado da nossa Hinata-chan~ – A voz de Sasuke, mais alta algumas oitavas, e o sufixo infantil, que ele só usava quando queria provoca-la, fizeram o sangue da Hyuuga voltar a ferver.

- Tch, você ainda não parou com isso, Bakasuke?

- Claro que não! – Ele tinha as mãos nos bolsos, nenhuma rosa à vista. Sasuke nunca lhe oferecera as flores que distribuía indiscriminadamente para seus alvos. – Hinata-chan está treinando diligentemente, o mínimo que posso fazer é cuidar para que esteja se alimentando direitinho.

A moça bufou, revirando os olhos, mas mesmo assim arrancou uma mordida do pão recheado de carne de porco. Estava uma delícia, como sempre – ele não trazia nikuman todas as vezes; no dia anterior fora onigiri, no outro, karepan, seu favorito, e no outro ainda fora um obento completo. Não conseguia recusar, então ficava irritada com ele, consigo mesma, com a pessoa que fizera aquele pão, com o entregador de farinha de arroz, com o fornecedor de carne de porco e com todos os outros responsáveis por aquele alimento delicioso ter chegado até ela.

Inferno!

Já tinha algum tempo que Hinata percebera que a presença irritante de Sasuke se tornara mais frequente em sua vida: os encontros "acidentais" enquanto fazia sua rota de patrulha, insistir em sentar ao seu lado quando conseguiam se encontrar com os outros para compartilhar refeições, a desculpa esfarrapada de cumprimentar seu pai enquanto a acompanhava de volta ao Clã Hyuuga, a voz cantarolada e o sufixo infantil ao final de seu nome, os olhares, os sorrisos e, agora, surgindo após seus treinos com lanches diversos.

Consequentemente, a presença irritante de Sasuke se tornara ainda mais irritante.

Precisava perguntar a Itachi-san se o idiota de seu irmão não tinha batido com a cabeça em algum lugar e por isso estava preso naquele delírio de que eles eram próximos o suficiente para o caçula dos Uchiha dedicar tanto de seu tempo a irritá-la – embora não pudesse reclamar da comida.

Os segundos enquanto ela devorava o pãozinho transcorreram, carregados com a expectativa que emanava de Sasuke. A Hyuuga mastigou o último pedaço com raiva, sentindo o peso do silêncio compartilhado. Amassou o papel em que o nikuman viera embrulhado e marchou até o banco onde deixara seu casaco e o suporte de armas que tirara da coxa para treinar seu taijutsu. Jogou o papel na lixeira ao lado do banco, preparando-se para ir embora da área do bosque/área de treinamento entre seu clã e o de Sasuke.

- Você já pode parar com isso, Bakasuke, eu estou bem.

- Eu sei.

- Então por que, diabos, você continua aparecendo onde quer que eu esteja? – Ela rosnou, virando-se para ele. Sasuke deixou que ela se aproximasse o suficiente para gritar em frente a seu peito, a diferença de altura entre eles impedindo que fosse diretamente em frente a seu rosto, por mais que ela estivesse se erguendo nas pontas dos pés. Hinata ficava vermelha das orelhas até o pescoço quando estava com raiva, era bonito ver a cor tomando-a. – Eu não fui rejeitada ainda, eu não desisti!

- Eu sei. –- Respondeu o Uchiha. – Eu também não.

- Você? Do que você desistiria?

- De você.

Ali estava, a declaração.

Uchiha Sasuke se dera conta de que não queria que acontecesse consigo o que acontecera com Hinata e Menma: não queria que ela continuasse sem saber o que sentia por ela e logo aparecesse de braços dados com outrem.

Não queria exatamente ter se confessado ali, porque não fazia seu estilo. Era um romântico, queria que pudesse ter sido em um passeio de primavera sob as cerejeiras – mas talvez isso a lembrasse de Sakura – ou no inverno, tarde da noite, sob a marquise de uma loja iluminada quando caísse a primeira neve ou num momento cândido em que Hinata perceberia através de suas ações, não apenas por suas palavras, que estava apaixonado por ela – e ela por ele, em sua fantasia.

Esse momento cândido seria o mais difícil de arquitetar, especialmente porque o Uchiha não tinha parado de distribuir sorrisos, elogios e rosas para seus "fãs" e provavelmente nunca o faria. Era da personalidade daquele Sasuke precisar flertar com as pessoas, ser querido, saber que poderia tê-los, se quisesse, mas que quem realmente queria era aquela Hyuuga irritadiça e bruta que agora o encarava, abrindo e fechando a boca, olhos arregalados, o casaco e a bolsa de shuriken escorregando e caindo de seus dedos amolecidos pelo choque.

- O-o quê você...

- Eu gosto de você, Hinata. – Era melhor falar rápido caso precisasse fugir dos Punhos Gentis menos gentis da vila. – Eu gosto de você e quero que namore comigo.

A cor subiu ao rosto de Hinata tão rápido que Sasuke poderia jurar que vira vapor saindo dela e ficou momentaneamente preocupado que ela pudesse desmaiar, mas conhecendo a princesa do Byakugan, era provável que a vermelhidão era originada pela raiva, não pelo embaraço.

A kunoichi abaixou o rosto carmesim até seus olhos encontrarem as sandálias sujas, suas mãos se apertaram em punhos ao seu lado e tentou fazer sentido das palavras dele e das milhares de imagens e sensações que elas provocaram em sua mente. Uchiha Sasuke não podia gostar dela, ela gostava de Menma, ainda não tinha se declarado, mas Sasuke sabia que ela gostava de Menma, ele estava lá no dia em que vira oficializado o relacionamento de Sakura e Menma, ele sabia que ela tinha ficado chateada naquele dia e que estava chateada ainda, Sasuke era um galinha, um galanteador barato, ele flertava até com a senhora do hortifrúti pelo simples prazer de ter as pessoas aos seus pés, ele não podia gostar dela, eles eram como estranhos, embora se conhecessem desde berço, Sasuke não podia gostar dela, ela era uma bruta, uma indelicada, mais rápida com os punhos do que com as palavras, Sasuke não podia gostar dela, não conseguia acreditar que as pessoas achavam aquele Uchiha atraente, ele só tinha palavras macias, e, tudo bem, Sasuke era um Uchiha, um usuário do Sharingan, só ficava atrás dela em todos os testes de nível ninja que já fizeram na vida, então era compreensível que ele fosse popular, mas mesmo assim, Sasuke não podia gostar dela, ele nunca gostava a sério das pessoas, com ela não seria diferente, ele não mudaria por uma garota, ele era um galinha, um galanteador, um flerte barato, um flerte vazio, aquilo devia ser uma piada, ele devia estar querendo rir às custas dela, só podia ser isso, Sasuke não podia gostar dela.

- Idiota. – A palavra saiu baixa.

- Uhn? Hinata? – O punho fechado dela tremia.

Sasuke achou ter ouvido alguma coisa, então deu um passo a frente apenas para recuar de novo quando a Hyuuga levantou a cabeça, vermelha do rosto ao colo, olhos brilhando, raiva contorcendo suas feições. O shinobi teve certeza que iria apanhar e na fração de segundo que Hinata precisou para alcança-lo, Sasuke teve certeza de que estava apaixonado por ela, de que era um masoquista e de que ela ficava linda daquele jeito.

- Seu idiota! Idiota! Bakasuke!

Os punhos gentis caíram sobre si enquanto ela o xingava, mas bateram contra as palmas abertas do rapaz com menos força do que ele esperava e sem qualquer vestígio de chakra. Ele não conseguiu evitar o sorriso bobo enquanto se defendia.

- Eu. Não. Gosto. De. Você. – Ela pontuou as palavras com golpes cada vez mais fracos.

- Eu sei.

- Eu. Não. Desisti. Ainda.

- Eu sei. – Sasuke não conseguiu impedir o sorriso se abrir mais ao ouvir o ainda.

Hinata baixou as mãos de volta para a posição lateral, desfez os punhos. A luta deixou seu corpo. Estava cansada. Estava cansada desde que sentira seu coração se partir e decidira que seguraria os cacos juntos com as próprias mãos até conseguir colá-los. Ainda não arranjara qualquer coisa que pudesse manter os pedaços unidos, mas conseguira vários cortes das rachaduras.

- Por que disse isso?

- Porqu verdad que eu sinto.

Olhos perolados o encararam, incrédulos.

Ela não conseguira se confessar para Menma, cara a cara, embora nunca tivesse escondido seus sentimentos.

A coragem de Sasuke a surpreendeu porque destoava de sua própria covardia inercial.

Era mais um motivo para acreditar que ele não estava dizendo a verdade, que era só mais uma cantada ruim, um gracejo sem profundidade. Como ele podia dizer aquelas palavras em voz alta, revelar seus sentimentos sem titubear, permanecer na frente dela sem nem desviar os olhos? Não tinha graça nenhuma aquela brincadeira.

A certeza de que o rapaz não estava sendo sincero, como fazia com todas as outras pessoas com quem flertava, apaziguou a raiva de Hinata. Ela deu as costas ao Uchiha, abaixou-se para pegar seu casaco e a bolsa de shuriken que deixara cair antes, jogou o casaco sobre o ombro e virou-se para o ultimato:

- Se fizer essa brincadeira de novo...

- Não é brincadeira. – Sasuke a interrompeu, claramente não dando valor à própria vida. – Eu gosto de você, namora comigo.

Ugh! Como ele podia ser tão IRRITANTE?

- Seu... – Ela rosnou.

- Namora comigo.

- Não! Cala a boca!

- Hinata, eu gosto...

- Ugh! Para!

- Hina-... – As mãos dela foram parar sobre sua boca com mais força que o necessário para impedir que ele continuasse. As mãos dela estavam quentes, Sasuke queria tocá-las com as suas, segurá-las, entrelaçar os dedos, sentir os pelos de seus antebraços, a pele macia do tríceps, o nó do cotovelo. Os olhos perolados não deixaram que ele se distraísse mais com as sensações.

- Mais uma palavra sobre isso e eu mato você.

O Uchiha levantou as mãos, palmas voltadas para ela como rendição, e aquiesceu com a cabeça. Com uma sobrancelha arqueada em ceticismo, Hinata se afastou.

- Eu realmente gosto de você, Hinata.

Sasuke foi dormir com um roxo no estômago com o formato exato de uma palma e um corte no lábio inferior proveniente de uma testada, golpes dos quais poderia ter desviado facilmente, mas cada vez que sorria seu lábio repuxava e seu abdômen reclamava de cada suspiro satisfeito.

Sua confissão em contato com o ar tornou-se matéria, ganhou peso, formato, significado, propósito.


My girl's a Dere

A Tsun-TsunDere

Just saying "hi" gets me a punch in the face

And if I should compliment her, she starts to chase

Kakashi, sempre um sensei preocupado e prestativo, tinha as melhores ideias que podiam levar às piores situações.

O exame para o nível jounin se aproximava e com exceção de Chouji, todos os outros ainda eram chuunin, o que nunca os impediu de receber missões de rank acima de seus níveis – isso acontecia com todos os ninjas, eles não era especiais, por questões de disponibilidade e péssimo gerenciamento de pessoal –, contudo o pagamento e o status não eram diretamente proporcionais à periculosidade da missão, dependendo realmente do peso do nível.

E eles não podiam ser chuunin para sempre.

Seis meses atrás a ideia de Kakashi e dos outros sensei de juntar os chuunin sob seu comando para treinos coletivos parecera bastante promissora, visto que todos tinham estilos diversificados e que alguns realmente precisavam de ajuda.

(Olhando para o treino desengonçado de Tenten, que mais se machucava do que atacava, para Ino, fechando os olhos a cada golpe, Shikamaru, mais preocupado com observar as formigas do que com lutar, e Kiba, mal conseguindo se aproximar de Akamaru sem chorar, Sasuke tinha suas dúvidas se todos iriam sobreviver ao exame.)

Três meses atrás eles tinham desenvolvido uma boa dinâmica de grupo: Hinata possuía a firmeza para manter os pervertidos na linha, Menma usava de sua paciência para ajudar aqueles que estava com dificuldades, Sakura tinha o espírito de líder para animar a todos, Chouji mantinha a seriedade para que o regime de treino fosse seguido à risca. Sasuke só tentava não ficar na mira de Tenten nem no caminho de Lee quando ele resolvia correr de ponta cabeça, aproveitando as chances que tinha para lançar sorriso para sua garota especial.

Dois meses atrás Menma e Sakura ainda não eram um casal, Hinata ainda não tinha tido o coração partido, Sasuke ainda não tinha se declarado.

Há um mês tudo aquilo acontecera, mas as coisas continuaram sem grandes problemas em seus treinos semanais.

Uma semana atrás Tsunade ficara doente demais para atender a missão diplomática mais importante de Hokage: a visita anual às vilas e aldeias da fronteira do País do Fogo, região onde ocorreram as batalhas, diretamente afetada pela última guerra; evento inadiável, Tsunade convocou Sakura para fazer a rota de visitas em seu lugar, uma vez que ela era a filha do herói da vila que também lutara bravamente na guerra da fronteira. Se a Hokage estava indisponível, Sakura era a única escolha possível. E ainda levaram Chouji como escolta.

Lá se foi o equilíbrio do coletivo de treinamento.

No sorteio das duplas daquela sessão, Hinata caíra com Lee para treinar taijutsu e Menma acabou com Kiba para continuarem o treino de cooperação entre mestre e fera – talvez se o Inuzuka não ficasse esfregando na cara de seu cachorro, que estava com ele desde filhote, sua preferência por gatos, Akamaru não se sentiria desprezado e fosse mais dócil para com seu dono. Sasuke era Time Akamaru naquela aposta. O Uchiha ficara responsável por Shikamaru, que não era um parceiro ruim quando conseguia manter o foco, então eles estavam trabalhando na atenção do Nara. Neji e Shino eram fortes candidatos a passarem na prova. Neji, apesar de suas tendências a usar o Byakugan para espiar moças se trocando, era um mestre das técnicas de seu clã, e Shino conseguia fazer uso dos insetos, embora se recusasse a deixar que eles pousassem em si, o que configurava em mandar todos atacarem o oponente. Rústico, mas funcionava, e servia para melhorar a proteção do ponto cego de Neji.

Restaram Ino e Tenten. O problema da primeira era hesitar nos ataques e congelar na defesa. Ino preferia o trabalho forense e de inteligência. Era muito boa em missões de detecção e resgate, quando não precisava batalhar, e sua habilidade mais forte era a negociação. Tenten tinha o potencial, mas era ansiosa e precipitada, invocando mais ou menos armas do que planejara, fazendo com que perdesse o ritmo do ataque. O treino entre as duas sempre acabava com alguém machucado e não necessariamente elas mesmas.

- Kunai!

Todos que ouviram o grito de Tenten se abaixaram. A lâmina passou zunindo por Shikamaru, picotando alguns fios do topo de seu rabo-de-cavalo, sua trajetória seguindo o caminho do flanco de Akamaru como alvo até que Menma, por reflexo, esticou a mão e a interceptou. O sangue começou a correr e pingar no chão antes que os presentes conseguissem entender o que acontecera.

- Menma! Desculpa, desculpa, desculpa! – Tenten correu até o loiro.

- Ah, não foi nada, Tenten-chan. – O Uzumaki gemeu ao abrir a mão esquerda para inspecionar o corte reto na palma e os pequenos talhos na primeira falange de todos os dedos. Limpou a lâmina na calça e a devolveu à Tenten pelo cabo. A kunoichi a recebeu de volta sem mais desculpas. Todos já tinham visto ou experimentado aquela mesma situação nos treinos ou em missões com a Mitarashi para se preocuparem muito com um corte em uma área não vital. – Vou só fazer um curativo.

Tenten concordou com a cabeça antes de voltar para o lado de Ino. Menma sinalizou para Kiba que iria cuidar dos cortes. A pequena comoção distraiu Shikamaru, que correu até Akamaru para fazer carinho no cachorro, fazendo a voz ridícula que os humanos insistiam em usar para se comunicarem com bebês e animais e animais bebês, certificando-se de que ele estava bem e que não ficara assustado em ser um alvo involuntário, para qual o cão lhe respondeu com uma lambida do queixo à testa.

Dando de ombros, Sasuke se aproximou de Menma sentado em uma das mesas de piquenique ao redor do campo de treinamento onde tinham deixado a caixa de primeiros socorros. Era a primeira vez que precisavam usá-la de verdade, porque Sakura ficava responsável por curar os machucados imediatamente, então não tinha muita coisa. Espiando dentro dela, o Uchiha viu que seu amigo iria utilizar o último rolo de atadura e que fora o pacote de gaze que Menma tinha aberto para estancar e limpar o sangue, só tinham mais um. Era um kit de primeiros socorros bastante defasado para um grupo de ninjas que estavam prestes a se tornarem jounin. Ou eles eram demasiado confiantes em suas habilidades e acreditavam que nunca iriam se machucar ou dependiam demais da presença de ninjas médicos com chakra curativos em campo.

Sasuke se virou ao ouvir os passos conhecidos se aproximarem. Ao longe viu o corpo inerte de Rock Lee sob uma árvore e sabia que ele devia ter visto o sangue escorrendo do ferimento de Menma e desmaiado, já passara por aquilo com o rapaz. Menma levantou os olhos quando Hinata se aproximou o suficiente, mas o Uchiha percebeu que ele não queria ter feito isso. A presença da Hyuuga agora o deixava desconfortável, principalmente quando Sakura não estava presente.

- Hinata-chan~

- Quieto, Bakasuke.

Menma abaixou a cabeça novamente, concentrando-se em tirar a gaze encharcada de sangue e colocar uma limpa. O olhar de determinação de Hyuuga Hinata não se abalou com o óbvio desinteresse do loiro. O canto da boca de Sasuke subiu em um sorriso pequeno. Ali estava a mulher que amava, mantendo-se fiel ao seu coração e seus sentimentos, tirando do bolso um pote pequeno de unguento e um tubo fino fechado com uma rolha e contendo um pó branco, mantendo-os em sua palma aberta como oferenda. Menma não levantou a cabeça.

- Pó anticoagulante e pomada antibacteriana com lidocaína para a dor. – Ela explicou. – Hanabi que faz.

- Hinata-chan~, como você é gentil~!

- Não estou falando com você. – Hinata não tirou os olhos da figura imóvel de Menma, da gaze se avermelhando de novo. – Posso?

Menma não respondeu, não levantou os olhos, não fez menção de aceitar o que Hinata lhe oferecia.

Sasuke se arrepiou observando a cena se desenrolar. Seu amigo nunca rejeitara abertamente a Hyuuga, também nunca a encorajara, e aceitar um remédio de um companheiro da Folha zelando pelo seu bem estar e integridade física não constituía encorajamento, mesmo sabendo que esse companheiro nutria sentimentos românticos por você, era uma questão de sobrevivência em campo.

- Menma... – A voz do Uchiha saiu baixa, rouca ao fundo, ameaçadora. Cumpriu sua função de fazer o loiro olhar para cima, para o melhor amigo. Cerúleos encontraram ônix, mas não perolados.

- Tch. – Hinata clicou a língua, sua paciência esgotada naquela interação sem sentido. – Cuide do corte ou tenha uma infecção e morra, como se eu ligasse.

Ela deu dois passos na direção de Sasuke, tomou-lhe a mão e colocou os itens na palma. As pontas dos dedos de Hinata estavam geladas e o ímpeto de segurar as mão dela nas suas voltou com toda a força quando os olhos leitosos encontraram os seus, brilhando com algo que Sasuke interpretou como gratidão.

- Hinata, eu... – O Uchiha iniciou antes que conseguisse se controlar, as palavras impulsionadas pelos seus sentimentos, pela sua personalidade supersincera, pela proximidade, pela facilidade que era para ele dizer aquilo outra e outra e outra vez.

- Agora não, Bakasuke! – Ela rosnou, pisando no pé dele antes de marchar de volta para onde tinha deixado Lee para tentar acordá-lo e voltar ao treino.

- Ai! – O shinobi mancou até a mesa onde Menma continuava sentado com a cabeça baixa, a perfeita imagem do babaca que sabia que agira como um babaca, mas que tentava justificar suas ações para si mesmo.

- Sasuke...

- Cala a boca. – Longe da Hyuuga sua raiva voltou. Sasuke jogou uma perna para se sentar no banco de frente para o melhor amigo, deu-lhe um tapa nada delicado na cabeça e puxou a mão machucada para si, arrancando a gaze de uma vez, despreocupado com a dor que o outro poderia estar sentindo. Que Menma sofresse um pouco, ele merecia. – Se você abrir a boca para tentar justificar como acabou de agir com Hinata, eu quebro seus dedos.


Can we get along? You're so headstrong

There's no way, go away, now so long!

Just talk to me and you will see

That's not fair, using flair you dummy!

Sasuke lembrou-se de sorrir galantemente para a auxiliar do exame jounin distribuindo as garrafas de água no salão em que eles estavam aguardando os resultados antes de tomar todo o líquido em goles sôfregos. Seus olhos doíam de tanto usar o Sharingan, suas costas doíam de carregar os civis que precisava salvar, suas pernas doíam pelo uso intenso de chakra para se manter fixo ao terreno e para saltar mais alto, sua cabeça doía pela adrenalina produzida rapidamente e despejada em sua corrente sanguínea para que conseguisse salvar o maior número de vítimas enquanto desviava dos ataques inimigos em forma de bolinhas de tinta.

Eles tinham decidido que a última prova do exame seria um cenário de desastre natural com vítimas a serem resgatadas e cuidadas enquanto os participantes se defendiam dos ataques de inimigos que tinham provocado o desastre para tomar o território. Era um teatro mais elaborado do que o necessário. Número de pessoas salvas acrescentava pontos, ser acertado pelas balas de tinta deduzia pontos, a qualidade do salvamento dos civis e conseguir nocautear inimigos também importava para o placar.

O telão com as fotos de todos os 32 ninjas que tinham restado para a última etapa do exame brilhava agitado com pontos sendo somados e subtraídos em tempo real enquanto os participantes tiravam um momento para reidratar, cuidar dos ferimentos, tomar analgésicos paliativos até que pudessem voltar para suas casas, tomar banho para remover a tinta das balas e dormir pelos três dias de licença que eles tinham recebido para depois da prova.

Hinata e Sakura disputavam o primeiro lugar. Sasuke estava em quarto, mas a pontuação do terceiro colocado – um ninja um ou dois anos mais velho, sabia quem era apenas de vista, não tinha ideia do nome dele – tinha estagnado fazia alguns segundos e o Uchiha o estava alcançando. Menma estava em sexto, subindo. Shikamaru, Neji e Shino também estavam no top 10, Ino estava quase conseguindo passar a nota de corte, mas Kiba, Rock Lee e Tenten – esta em último lugar, suas habilidades não sendo exatamente úteis no cenário de catástrofe, apesar de ter conseguido tirar do jogo quatro inimigos, Sasuke não sabia se acidentalmente ou de propósito – teriam que refazer a prova no ano seguinte.

Sasuke procurou sua pessoa favorita com os olhos. Hinata tinha perdido o casaco lilás na batalha e segurava o cabelo pra cima, longe da nuca suada – tinha uma mancha de tinta sobre a omoplata onde o top não cobria e outra na panturrilha direta –, ele reconheceria aqueles bíceps e aquela cintura em qualquer lugar. Ela levou a garrafa de água aos lábios enquanto lançava um olhar de esguelha para o telão, o rosto impassível em sua confiança. Sua pontuação tinha tomado uma dianteira considerável para consolidá-la como primeira colocada, melhor ninja do ano a se tornar jounin. Conhecendo Hiashi, o pai mais orgulhoso e babão de toda a vila, ele passaria os próximos anos de "reuniões" com Fugaku se gabando.

A adrenalina da batalha ainda não abandonara o sistema de Sasuke por completo, esquentando-o junto com o orgulho que sentia pelas conquistas da pessoa que amava. Marchou até ela, as palavras já prontas para rolarem de sua língua.

- Menma, o que foi? Está machucado? – As cores vibrantes que eram os cabelos loiro e rosa de Menma e Sakura capturaram sua visão. Eles estavam a poucos passos a noroeste de Hinata e Sasuke assistiu, horrorizado e puto, o Uzumaki ficar sobre um joelho e tirar do bolso um anel. – Menma!

Xingou mentalmente seu melhor amigo. Menma tinha-lhe confiado que planejava pedir Sakura em casamento assim que os dois se tornassem jounin e conseguissem uma renda melhor com as missões, mas não esperava que o idiota apaixonado fosse fazer aquilo assim que acabasse a droga do exame, na frente de todos.

- SIM! – Sakura respondeu, extasiada, caindo de joelhos e abraçando o namorado. – Sim, sim, sim!

As pessoas começaram a aplaudir e a se aproximar para parabenizar o casal. Hinata desapareceu tão rápido que Sasuke só percebeu quando a garrafa de água que ela deixara cair molhou seus pés. Não tinha a mínima vontade de se juntar à comemoração dos amigos, mas eles ainda eram seus amigos.

No telão, as pontuações pararam, as posições se fixaram. Como primeiro lugar a foto de Hinata foi aumentada, tomando o centro da tela, com Sakura em segundo e Sasuke em terceiro, cada um de um lado, emoldurando-a.


I've got myself just a little bit of love that I wanna spend on not you

'Cause baby, I'm afraid you'll say, that it's not okay with you

Oh-oh, 'cause you're always laughin'

And jokin'

You look like a clown

But I hope you mean what you say

"I do"

O Clã Uchiha e o Clã Hyuuga eram dois complexos gigantescos e recebiam, com razão, a atribuição de bairros dentro da vila. No início ambos eram apenas uma casa principal, mas a população foi crescendo, as famílias foram se expandindo, as casas, espalhando-se, até que os líderes de ambos os clãs, por mais que vivessem harmoniosamente, acharam por bem fazer uma divisão em seu território para manter alguma privacidade para as técnicas secretas de cada clã. Para tanto, ergueram muros de ambos os lados de uma pequena área de floresta, deixando-a como um corredor natural.

Com o tempo a pequena floresta, que acabava no sopé da montanha em que foram esculpidos os Rostos, assim como ambos os clãs tinham suas retaguardas protegidas pela rocha, tornou-se um parque, primeiro para os membros dos clãs vizinhos, depois público, com brinquedos para crianças e equipamentos de calistenia – isso fora coisa de Tsunade, que prezava pelo bem estar da terceira idade mais do que tudo, provavelmente devido sua própria proximidade com essa faixa etária.

Sasuke, mãos nos bolsos do uniforme jounin, colete novo pinicando-lhe o pescoço, chegou ao fim do bosque entre os clãs, apenas a montanha como obstáculo. Não era um lugar para se frequentar durante a noite, portanto não havia iluminação. O rapaz ergueu a cabeça e ativou seu Sharingan.

A duzentos metros do chão havia uma saliência de vinte metros de comprimento e larga o suficiente para que uma pessoa em pé não conseguisse ser avistada de baixo, mas uma pessoa sentada ficaria com as costas rentes à montanha e com as pernas penduradas sobre a beira.

Invocou uma de suas águias e deixou que ela o pegasse pelo antebraço para que fosse içado, o pássaro sumindo assim que deixou Sasuke sobre a saliência. Gostava da vista, Konoha brilhando durante a noite era um espetáculo, mesmo que olhar para baixo lhe provocasse frio na barriga.

Hinata não se mexeu de onde estava sentada quando Sasuke se aproximou. Fora ela quem primeiro descobrira a saliência quando ainda eram crianças brincando juntas no bosque, antes mesmo de serem alunos da academia, mal tinham começado a aprender a concentrar chakra nas extremidades do corpo. Da primeira vez que tentou subir, Hinata caiu e quebrou os dois braços, o que não a impediu de tentar de novo. Ela tinha predileção pelo topo.

- Hinta-chan~ – Chamou ao sentar-se ao lado dela, o sorriso fácil não foi retribuído.

- Bakasuke.

A Hyuuga também usava seu uniforme jounin. Devia ter terminado seu trabalho e ido direto para a montanha. O outono já começara e o vento lá em cima soprava trazendo o frio que a estação prometia. Se subissem ali durante o dia podiam ver a vila pintada de vermelho e laranja quase por completo com as árvores mudando de cor.

- Namora comigo.

- Sasuke...

Disseram ao mesmo tempo.

Para Sasuke era mais fácil dizer aquelas palavras do que oi, ainda com o mesmo significado e peso de quando as dissera pela primeira vez.

Para Hinata, era fácil ouvi-las, porque ele não podia estar falando sério, mas mesmo assim era difícil responde-las.

- Eu gosto de você.

- Não gosta e eu não posso retribuir.

Os olhos ônix deixaram de mirar as luzes de seu lar e subiram para a moça ao seu lado. Olhos perolados o encaravam de volta, tristes em sua determinação, sobrancelhas franzidas, o batom perfeitamente vermelho.

Sasuke entendeu o que ela finalmente decidira fazer de permitir que ele lhe dissesse as palavras toda chance que tinha quando estavam relativamente sozinhos.

- Você está me rejeitando agora porque não quer ser igual a Menma.

- Sim.

- E aceitar ficar comigo agora seria só uma desculpa porque perdeu sua chance com ele.

- Sim.

- Eu não me importo.

Essa resposta desestabilizou a expressão decidida de Hinata. Ela piscou enquanto seu cérebro repetia as palavras várias vezes para ter certeza que não entendera errado.

- Você pirou.

- Talvez.

- Você está dizendo que quer ficar comigo com a esperança de que um dia eu passe a gostar de você do jeito que gosta de mim?

O Uchiha quis rir do modo como ela disse aquilo, como se a palavra certa fosse gostar e como se os seus sentimentos tivessem solidificado de uma certa maneira e os dela ainda estivessem moles e sem forma, maleáveis, mas segurou a expressão confiante contra a confusa dela.

Hinata balançou a cabeça.

- Isso é tóxico.

- Não é. – O rapaz deu de ombros, ele já passara muito tempo refletindo sobre aquilo. – Hinata-chan~

A Hyuuga ouviu o chamado na voz dele e o encarou. Sasuke sustentava o sorriso mais triste que jamais vira em seu rosto.

- Eu te amo. – Não era gostar a palavra certa. A respiração da moça ficou presa na garganta. – Eu te amo independente de você saber disso e vou continuar amando você aceite ou não. – Para um galinha galanteador, distribuidor de flertes baratos, até que ele era bastante convincente. – Vou te amar até não te amar mais e você não pode me impedir.

Ele riu de si mesmo, Hinata não achou graça.

Sentiu-se triste com as palavras de Sasuke, já estivera e estava naquela situação.

Amar alguém até deixar de amar.

Poderia seguir ao lado dele daquele jeito, unilateral, sobrevivendo de um talvez?

- Namora comigo. – Sasuke não desistia. Hinata até que gostava disso nele. Dadas as circunstâncias, ele fora mais persistente do que ela. – Na pior das hipóteses, sou eu mesmo partindo meu próprio coração.

- E na melhor? – A moça sussurrou.

- Uhn?

- Você é mesmo um Bakasuke.

- Isso é um sim?

Hinata levantou-se, o equilíbrio impecável, esticando os braços acima da cabeça para se espreguiçar. Sasuke também se pôs em pé, as mãos concentrando chakra para manter-se colado à montanha, o frio na barriga voltando agora que não estava mais sentado, mas tentando fingir indiferença.

- Vamos, eu tô com fome.

- Hinata-chan~ – A emoção quase o fez soltar as mãos. Quase. – Seria esse nosso primeiro encontro?

Mesmo no ambiente mal iluminado, Sasuke teve certeza que o rubor que subira às faces da moça daquela vez não era de raiva.

- S-só se a comida for boa!


And I wonder what you would think

If I let my pride down, let it sink

Could we hold hands, kiss?

Live our lives in gentle bliss?

O trio de genin achou estranho que o seu sensei não estivesse no lugar combinado na hora marcada para a primeira reunião de seu time, mas como a vida de ninjas podia ser imprevisível, esperaram.

Uma hora.

Duas horas.

Antes que três horas se completassem, eles decidiram que já era o suficiente e pegaram o caminho que levava à Torre do Fogo para verificar se tinham sido informados corretamente o dia e horário do encontro. O sol não demoraria a se pôr.

Decidiram fazer um desvio pelo centro comercial para comprarem raspadinha no balcão ao lado da barraca de legumes – aquela loja já fora um café, uma padaria, um relojoeiro. Os três estancaram, perplexos, quando se aproximaram da barraca.

Ali estava seu sensei, imediatamente reconhecível pelo colar com a insígnia dos Uchiha, o cabelo arrepiado que lembrava a bunda de um pato e o fato de estar distribuindo piscadelas e rosas vermelhas para as pessoas ao seu redor.

Uchiha Sasuke era um ninja reconhecido internacionalmente por seus feitos, nacionalmente por suas habilidades ímpares e localmente por sua fama de galanteador barato.

- Esse é o nosso sensei? – Perguntou Azumi, sustentando o mesmo olhar de descrença de seus dois colegas para a cena.

- Aham. – Responderam os dois companheiros em uníssono. Ryouta tinha o último databook dos ninja ativos em suas mãos, aberto na página de informações e estatísticas de Uchiha Sasuke.

- Ele não é casado?

- Aham. – Status: casado.

- Ha! – A exclamação vinda de trás fez com que os três pulassem de susto. A origem do som de deboche era a velha dos legumes, vassoura em punho, olhos na cena de Sasuke e seus acólitos. – Isso aí é só um teatro que ele faz para se sentir bem.

Os três juntaram-se à velha no exercício de observação. Sasuke parecia completamente em seu elemento: extrovertido, conversando com todes, sorriso de cá, piscadela acolá, ouvidos acostumados às frases bobas de "Sasuke-kun, eu sou sua fã", "Sasuke-kun, kyaaa~", "Sasuke-kun, eu fiz isso pra você", "Sasuke-kun, quer jantar lá em casa?", "Sasuke-kun, pode treinar comigo um dia desses?". Todos os pedidos eram gentilmente recusados com desculpas, todos os presentes eram convenientemente esquecidos ou deixados para trás. O Uchiha, havia muito tempo, não fazia valer os flertes que destinava às outras pessoas.

- Deixa a esposa dele aparecer e vocês logo verão a verdade.

Com a pontualidade de um relógio, Hyuuga Hinata virou a esquina entre o restaurante de udon e a loja de conveniência. Trazia em si o batom vermelho, o cenho franzido como se estivesse brava com o mundo, uma mão no bolso da calça, na outra uma sacola de compras retornável, e o queixo erguido com confiança.

Com a precisão de uma bússola, a atenção de Uchiha Sasuke se voltou naquela direção, seu sorriso fácil se transformou em contentamento genuíno com a serotonina produzida pela visão da esposa.

- Hinata-san? – Ryouta virou as páginas do databook furiosamente até chegar à seção de Hyuuga Hinata. A dela não tinha apenas informações e estatística, mas continha também curiosidades e uma entrevista exclusiva. O genin era fã da princesa do Byakugan e fizera questão de comprar a edição do livro que vinha com o pôster de corpo inteiro da jounin. Embora a informação de status matrimonial de sua ídola também lê-se casada, em lugar nenhum dizia com quem. – Hinata-san se casou com Uchiha Sasuke?

A velha riu.

Em um momento o Uchiha estava no meio da roda de fãs – se é que podiam ser chamados assim – e no momento seguinte restara apenas uma nuvem de fumacinha branca que se dissipou antes que a aglomeração notasse o moreno aparecendo ao lado da Hyuuga com um animado:

- Hinata-chan~!

Os anteriormente animado grupo que rodeava o shinobi, mais uma vez abandonado, dissipou-se sem que a velha precisasse bater neles com a vassoura. De novo.

Sasuke nutria uma fagulha de esperança que Hinata fosse ficar com ciúmes dele e lançar seu famoso olhar de desprezo – o olhar que era listado como um de seus pontos fortes no databook há anos – para os fãs que acabara de dispensar, mas ela nunca se dava ao trabalho.

- Vamos pra casa, Bakasuke.

Sasuke tomou a sacola de compras da mão dela e circulou a cintura da esposa no mesmo movimento, depositando-lhe um beijo rápido sobre o cabelos. Hinata cutucou-lhe as costelas com o cotovelo sem qualquer força, apenas para lembra-lo que podia acertar-lhe com força ali, se assim o desejasse, então era melhor que ele se mantivesse na linha. Seu marido sabia muito bem disso.

Antes que começassem a andar o Uchiha soltou as palavras mais desgastadas de seu vocabulário:

- Eu te amo, Hinata, namora comigo.

- Tarde demais, seu idiota, eu já sou casada.

Uchiha Sasuke riu alto, queria beijá-la de novo, nos lábios, de verdade, para sempre.

Hyuuga Hinata corou, mas negaria isso com todas as forças.

Eles passaram pela banca de legumes e Hinata acenou com a cabeça para a velha dona. Havia três crianças na frente da banca portando bandanas da Folha, o que fez a kunoichi se lembrar:

- Como foi o encontro com seu time de genin hoje?

- Eh? – Sasuke parou bruscamente. – Isso era hoje?


Os personagens aqui tem as características de Road to Ninja, não dizendo que estão O.C.

A quem leu até aqui, obrigada!