Título : Os Pontos Cardeais ou Rosa dos Ventos
Autor : Lilibeth McKeena
Pares : Severus Snape / Luna Lovegood
Censura : PG-13
Gênero : Espiritual
Spoiler : não tem. Algumas personagens podem ser considerados OOC.
Resumo : Na festa de Natal, alguns se voltam para o passado, e buscam na Magia Ancestral Celta as respostas às angústias do presente. O Ritual Wicca do Solstício do Verão apresentado pelos personagens de HP.
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Norte (Terra)
"de onde brotam os deuses"
"Solstício de Inverno, Alban Arthuan (a luz de Arthur) : tempo de inspirar e conceber, de morrer e renascer. O Sol abandona a Terra à sofreguidão da noite, só voltando quando sua violação é completa. As palavras druidas cerimoniais ecoam em seus ouvidos - nus de intenções, como seu corpo gélido - "Liberte-se, oh homem/mulher, do que quer que lhe esteja impedindo o aparecimento da Luz!", seu corpo vibrando em cada nota lembrada, aprendida a duras penas, evocada e invocada nesse momento pela voz retumbante da antiga sacerdotisa : "Esta é a noite do solstício, a mais longa noite do ano. Agora, a escuridão triunfa: no entanto, recua e transforma-se em luz. O fôlego da Natureza está em suspenso: todos aguardam, enquanto dentro do caldeirão o Rei da escuridão é transformado em Criança da Luz. Aguardamos a chegada do amanhecer, quando a grande mãe dará à luz novamente a divina criança do Sol, que é portadora da esperança e da promessa de verão... estamos todos acordados na noite. Giramos a roda para que ela traga a luz. Invocamos o Sol (Sol Invictus) do ventre da noite (vigília)...".
Fechando com cuidado o decrépito livro de Alta Magia Druida (ah... quantas vidas haviam terminado só para que aquele livro estivesse ali, na Sessão Reservada...), Snape reviu mentalmente se tudo estava de acordo com o que o livro informava. Como rezava o antigo tratado, ele havia se preparado adequadamente durante todo o dia anterior : havia - conforme o preceito antigo - jejuado e disposto o corpo e as vestes para o que precisaria ser feito na noite seguinte. Havia outras formas de fazê-lo, claro, sempre havia mais de uma forma de se imobilizar um hipogrifo : mas ele preferia que fosse feito do jeito antigo. Era a forma mais forte de se captar toda a magia daquela data, e ele ansiava poder conseguir isso, uma vez que fosse na vida. Pelo menos uma vez na vida ele gostaria de fazer algo do jeito certo. Mesmo sendo quem ele era. E agora - depois de tudo feito - teria de conviver durante toda a noite com a sensação de leveza anormal da cabeça, um corpo aparentemente distante dela, comandado por outra entidade. Se a sensação de distanciamento do próprio corpo era horrível, a sensação de plenitude mental o agradava bastante. Mais do que desejaria. Mais do que ousaria, em outra situação.
Mas era preciso prosseguir.
Como se a dor irritante aparentemente presente em seus músculos e nervos fosse algo corpóreo e não fruto da exploração de outras esferas durante o dia anterior, ele se obriga a sair e efetuar a colheita de ervas sagradas na Floresta Proibida : sabe que nessa noite - e somente nesta - elas estarão propícias para a colheita. Pouco importa se seu corpo debilitado reclame cuidados ou descanso, o mais importante é que as ervas sejam colhidas, e colhidas da forma correta. O mais importante sempre estará fora de si. Principalmente hoje.
Nesta cerimônia do Solstício de Verão a sacerdotisa diz: "Este é o tempo da rosa, florescência e espinho, fragrância e sangue. Agora, neste dia mais longo a luz triunfa e, no entanto, começa a declinar para a escuridão. O Rei Sol amadurecido abraça a Rainha do Verão no amor que é morte, pois ele é tão completo que tudo se dissolve na única canção de êxtase que move os mundos. Portanto, o Senhor da Luz morre para si mesmo e navega através dos mares misteriosos do tempo, buscando a ilha da luz que é o renascimento. Giramos a roda e partilhamos seu destino, pois plantamos as sementes de nossas próprias transformações e, a fim de crescermos, devemos aceitar até mesmo a partida do sol..."
Sua mente extremamente lúcida recorda as palavras do encantamento enquanto caminha na cálida trilha orvalhada da floresta, parcamente iluminada por uma tímida Lua Nova; embora a noite mal tenha se iniciado, a escuridão do ambiente envolve-o como um manto natural; toda a floresta respira em um ritmo próprio, ao qual ele se força a acompanhar. Continuamente respirando de forma pausada e profunda ele prefere o encantamento e colhe as primeiras ervas, acomodando-as ordenadamente em sua cesta de vime trançado somente em um sentido. Embrenha-se destemidamente dentro da Floresta até o Grande Carvalho Oculto, onde os psilocibes estão : no mais profundo cepo, bem no centro exato da Floresta, é ali e somente ali que eles crescem. Pega a foice curva, novamente profere a continuação das palavras rituais, faz o pequeno corte em sua mão e seu sangue rega a base do carvalho : que sua energia sirva de força e alimento a novos elementos, já que ele irá colher alguns, como tantos outros fizeram antes dele. Bem, talvez nem tantos assim, pensa entre divertido e ligeiramente enjoado, enquanto os negros cabelos cobrem-lhe a visão.
Sente o baque da energia ao fazer o corte, o sangue saindo e se esvaindo, ao mesmo tempo que se conecta magicamente ao Grande Carvalho : respira - ao menos tenta - controladamente para não desfalecer, enquanto a energia da união à Arvore do Ancião o toma por inteiro. E, intensa e rapidamente como veio ela se vai. Fortalecido e descansado, mais que intuitivamente suas mãos sabem quais psilocibes colher, e quantos : na contagem correta elas abandonam o campo, e ele silenciosamente agradece à Natureza que permitiu sua invasão ao seu refúgio mais secreto, e parte levando seu butim, sem nem uma vez olhar para trás. Porém, solidariamente, deixa sua semente sanguínea ali. Sangue e alma misturados na relva recém-revolvida, como um estranho e mágico feto do futuro que há de vir.
E vívido, rubro, um pequeno psilocibe semilanceata aponta nesse berço recém-construído.
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Mal sentiu seu retorno ao Castelo, como nem percebeu o caminho que escolheu até as masmorras : sentia apenas o peso (responsabilidade?) do cesto na mão direita, enquanto caminhava como que se seus pés deslizassem suavemente em uma superfície aquosa. Sentia a força da magia que o envolvia mais e mais a cada momento, sabia que seu corpo havia sido bem preparado, e agora também sabia que sua união com o Grande Carvalho o guiaria corretamente até o final do ritual.
Retirou as vestes de colheita, lavou-se na água da chuva que mãos humanas não tocaram e secou-se com o pano de linho virgem, e foi com a foice cujo corte nunca havia sido usado que ele preparou as plantas, enquanto entoava ritmicamente os encantamentos. Sentia a resposta em seu sangue, sua alma vibrava cada nota, envolvia-se mais e mais com o ritual à medida que este prosseguia, e foi em estado de quase êxtase de levou a bebida acre e muito quente aos lábios ressequidos e tomou o primeiro grande gole.
Foi de olhos completamente turvos que forçou garganta e estômago a aceitarem o restante da beberragem.
Já bastante entontecido, ajoelhou-se como deveria, observando entre embevecido e inebriado as paredes de sua masmorra fecharem-se delicamente sobre ele, como se também elas vibrassem ao som que provinha de sua garganta.
E - como deveria - pacientemente esperou, ainda entoando em voz cada vez mais rascante e incerta o antigo cântico druida, uma parte distante de sua mente ora tentando apaziguar um estômago rebelde, ora tentando manter-se equilibrado.
E quando seu corpo já não mais respondia, um último ato de consciência mostrou-lhe a aproximação gelada das pedras que o envolveram, enquanto prosseguia ouvindo vozes que não a sua continuarem a entoar o cântico ancestral.
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Psilocibes : Ahhh, todo mundo quer saber o que é, né ? Então tá : Psilocibes são cogumelos alucinógenos. :) Eles contém uma substância chamada psilocibina, droga alucinogéna que pode provocar o delírio; alguns são mortais. Lindo material para nosso Mestre das Poções, não ?
Psicocibe semilanceata é um dos mais venenosos cogumelos dessa espécie.